O contributo dos sistemas de informação para a missão das unidades de saúde na operação das centrais de reprocessamento de dispositivos médicos 

Os sistemas de informação desempenham uma função vital na eficiência operacional das unidades de saúde e das centrais de reprocessamento, agilizando a interacção e eficácia operacional.

As unidades de saúde são, cada vez mais, confrontadas com requisitos e imposições legais relativas à segurança dos pacientes e ao controlo de qualidade via processos certificados. A este cenário acresce o contexto actual de gestão, que obriga a duas condições quase dicotómicas: por um lado, o aumento do investimento para responder às exigências de qualidade por parte dos utentes dos serviços; e por outro, a permanente necessidade de melhoria da eficiência das actividades operacionais, na óptica da redução de custos e optimização de recursos.

Como parte integrante de uma unidade de saúde, seja na modalidade de off-site ou in-house, uma central de reprocessamento de dispositivos médicos é um centro de custo sujeito às condições e restrições acima referidas e cuja actividade, não obstante a contínua procura na melhoria da qualidade de serviço, importa também optimizar. Com efeito, e apesar dos recursos, materiais e humanos, empregues numa central serem consideráveis, o aumento da eficiência destes não pode influenciar a qualidade dos serviços prestados, nomeadamente no que respeita ao controlo de qualidade e aos riscos de contaminação e infecção hospitalar.

Ora, um dos investimentos com maior retorno e que contribui de forma decisiva para a optimização operacional de uma organização, ou departamento, é o investimento em sistemas de informação. Não só porque estes aportam a inovação, a homogeneização e meios de comunicação avançados mas, sobretudo, porque permitem elevar a produtividade, a agilidade operacional, o controlo e a inteligência sobre o negócio. No caso das centrais de reprocessamento, geridas com base em processos operacionais mensuráveis e uniformizados (e, em alguns casos, certificados) um sistema de informação acaba por ser uma ferramenta fundamental para a manutenção da qualidade do serviço e o simultâneo aumento do desempenho operacional. E é fácil verificar que a sua ausência pode ser um factor impeditivo à optimização operacional de uma central de reprocessamento. Vejamos alguns exemplos concretos.

  • Os sistemas de informação são, actualmente, os principais veiculadores de inovação. Tecnologias como códigos de barras, códigos data-matrix, RFID ou GPS não podem ser implementadas sem o seu suporte. Tais tecnologias são, comprovadamente, potenciadoras do aumento da produtividade que podem ser utilizadas em dispositivos médicos, contentores, equipamentos e cestas de lavagem e esterilização, armários de transporte e veículos, assegurando uma elevada eficácia na identificação unívoca, na redução de erros de leitura ou no auxílio à localização de objectos.
  • Outro aspecto onde os sistemas de informação contribuem para a eficiência operacional prende-se com os mecanismos de comunicação, desde a comunicação informal entre agentes das unidades de saúde e agentes da central de esterilização, até à integração automática de informação proveniente de outros sistemas. O potencial destes mecanismos permite, por exemplo, emitir comunicados específicos e associados a uma determinada tipologia de dispositivos (mantendo a comunicação estruturada e controlada) ou identificar, em tempo real, as necessidades, e respectivas quantidades, de dispositivos médicos para os blocos operatórios. As unidades de saúde conseguem, assim, identificar as disponibilidades de stock e os objectos em reprocessamento, podendo, também, ajustar e optimizar o planeamento de recursos humanos, salas e blocos operatórios.
  • Consequentemente, esses mecanismos de comunicação asseguram a melhoria da gestão de stocks e inventário presente nas centrais de reprocessamento ou nas unidades de saúde. Dada a ubiquidade dos sistemas de informação, qualquer alteração realizada ao inventário de uma unidade de saúde é automaticamente propagada e acessível à central de reprocessamento. Estas alterações, que contemplam não só modificações de quantidades e tipos de dispositivos, mas também de documentação e instruções de reprocessamento, são causadoras de um sem número de perturbações quando implementadas de forma manual ou não estruturada.
  • As actividades de reporting, avaliação e análise operacional são dificultadas na ausência de um sistema de informação. As funcionalidades, mesmo as mais básicas, presentes nos actuais sistemas providenciam vantagens que não podem ser alcançadas de um modo manual ou não estruturado. O desempenho de um qualquer processo passa sempre pela medição e controlo de métricas e indicadores operacionais, pelo que os movimentos e eventos da central de reprocessamento (gerados por colaboradores, dispositivos ou equipamentos) devem ser integralmente registados e analisados. Só assim a equipa de gestão tem a capacidade de tomar decisões respeitantes à optimização e produtividade com o menor grau possível de incerteza de informação.
  • Por fim, sem um sistema de informação capaz, a tarefa de implementação e manutenção de um sistema de gestão da qualidade (designadamente a norma ISO 13485), que responda aos requisitos normativos associados a processos, rastreabilidade, gestão documental e gestão do risco, torna-se cada vez mais árdua. Efectivamente, a operacionalização de fluxos de trabalho concordantes com objectivos de constância e uniformização só é objectivamente exequível através da introdução de um sistema de informação. As ramificações dos processos operacionais, decorrentes de diferentes tipologias de dispositivos médicos, e respectivas particularidades de reprocessamento, obrigam a uma miríade de etapas e procedimentos distintos de difícil padronização e controlo. Acresce que o procedimento de rastreabilidade, de importância fulcral para uma central de reprocessamento, quando implementado sem o suporte de um sistema de informação, pode facilmente induzir erros com consequências graves para utilizadores e utentes. Da mesma forma, a gestão documental, sem a presença de funcionalidades automáticas de criação, atribuição, aprovação e notificação obriga a um esforço suplementar excessivo que, em muitas situações, pode mesmo colocar em causa todo o sistema da qualidade.
  • Por último, a gestão do risco deve ser avaliada em qualquer actividade ou processo, implementados ou a implementar, na central de reprocessamento. Mecanismos para avaliação do risco devem ser criados por forma a avaliar o seu impacto e mitigar as consequências. Tais mecanismos, pela sua complexidade e requisitos de informação só se tornam eficientes se acoplados a um sistema de informação.

Os exemplos atrás descritos (e muitos outros poderiam ser identificados) demonstram que a capacidade de automatização e disseminação de informação é relevante para o aumento do desempenho dos colaboradores e para o planeamento antecipado da operação, quer por parte da central de reprocessamento quer pelas unidades de saúde.

Assim, e analisando a Figura 1., um sistema de informação para a gestão de uma central de reprocessamento deve ter em consideração um conjunto de módulos capacitados para dar resposta, não só aos requisitos do processo principal de reprocessamento, mas a todo o contexto de gestão operacional e a actividades de apoio, desde os processos de suporte e administrativos às questões logísticas e de controlo. Consequentemente deve o sistema de informação:

  • Fornecer a máxima disponibilidade operacional para todos os utilizadores, independentemente da sua localização, seja esta na central, nos departamentos das unidades de saúde ou nos circuitos logísticos;
  • Mapear os processos operacionais de forma integral, considerando as diferentes tipologias de unidades de saúde, especialidades médicas e dispositivos médicos, sem descurar a priorização de processos, os ní- veis de serviço e os mecanismos de comunicação;
  • Disponibilizar aplicações de mobilidade, não só para os circuitos logísticos mas também para as etapas do circuito de reprocessamento onde a utilização de um computador não seja possível ou conveniente (como na elaboração do pedido de reprocessamento ou na descontaminação);
  • Acompanhar, em tempo real, as actividades dos processos operacionais, administrativos e logísticos, através de dashboards de indicadores e relatórios funcionais de gestão;
  • Possibilitar o rastreamento integral dos dispositivos médicos reprocessados, bem como facilitar o cumprimento de normativos e sistemas de gestão da qualidade aplicáveis à operação;
  • Integrar, através de interfaces lógicos, com equipamentos operacionais (como lavadoras e esterilizadores), sistemas de informação empresariais (como ERPs), sistemas de controlo de assiduidade e sistemas de gestão de recursos hospitalares (como salas e blocos operatórios).

Este conjunto de características-chave configura os atributos funcionais elementares sobre os quais os requisitos detalhados devem ser desenvolvidos e adaptados à realidade de cada central de reprocessamento. Os projectos de implementação devem ser trabalhados em função das tipologias das unidades de saúde e da central de esterilização, e das especificidades dos fluxos de trabalho, processos e níveis de serviço.

A implementação de um sistema de informação numa central de reprocessamento é um projecto que requer um planeamento apurado e um compromisso permanente. As mudanças para um paradigma de inovação e automatização de informação comportam dificuldades que devem ser minimizadas através da colaboração e envolvimento de todos os stakeholders, de uma comunicação constante e pertinente por parte dos gestores e de um programa de formação à medida, completo e adaptado a cada perfil de utilizador. No entanto, as mais-valias e benefícios aportados pela plena utilização de um sistema de informação são evidentes. Não só pelos aspectos operacionais, onde ganhos de eficácia são imediatamente obtidos, mas também pelos ganhos ao nível da eficiência, com a constante identificação e avaliação de melhorias e optimização de recursos humanos, financeiros e materiais.

 

Autoria: Nuno Gomes

  • Licenciado em Informática de Gestão pela Universidade do Minho
  • Mestrado em Engenharia de Sistemas – Investigação Operacional pelo Instituto Superior Técnico
  • MBA University of Massachusetts – EUA